segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Copa do Mundo 2014 no Distrito Federal

Perguntas que ninguém fez serão problemas que ninguém quer.

1.   O projeto do Distrito Federal prevê verba para as cidades turísticas goianas no raio de 200 km de Brasília (Formosa, Alto Paraíso, Pirenópolis, Corumbá, Caldas Novas e Cidade de Goiás)?
2.    As cidades do Entorno DF serão usadas como 2ª opção da rede hoteleira do DF?
3.    Em caso positivo da pergunta anterior, existe previsão de verbas para esta rede hoteleira?
4.    Em caso positivo da pergunta anterior, existe previsão de cursos para os funcionários desses locais?
5.    As rodovias que serão utilizadas para translado dos turistas do DF para as cidades turísticas goianas serão duplicadas?
6.    Em caso positivo da pergunta anterior, existe previsão de postos rodoviários e do corpo de bombeiros nessas rodovias?
7.    Em caso positivo da pergunta anterior, existe previsão de viaturas, equipamentos e efetivos para essas Instituições?
8.    As Delegacias de Polícia do Distrito Federal estão sendo preparadas para atender os turistas?
9.    Em caso positivo da pergunta anterior, existe previsão da extensão desses cursos para as delegacias do Entorno e das cidades Turísticas goianas?
10.  Em caso positivo da pergunta anterior, existe a previsão de reforma das delegacias de policia do Entorno e das cidades turísticas?
11.  O efetivo empregado no policiamento ostensivo do Entorno e das cidades turísticas serão preparados para o atendimento do turista durante a copa?
12. Em caso positivo da pergunta anterior, quais serão esses cursos e quando eles terão inicio?
13.  Os turistas detidos poderão ser transportados nos porta malas das viaturas?
14.  Em caso negativo da pergunta anterior, existe previsão de substituição das atuais viaturas da PMGO?
15.  Foi realizado estudo sobre o aumento do consumo de drogas durante a copa?
16.  Em caso positivo da pergunta anterior, quais serão as ações sobre o tráfico de drogas no Entorno e nas cidades turísticas?
17.  O efetivo da Polícia Ostensiva no Distrito Federal é de 01 PM para cada 145 habitantes, no Entorno DF é de 01 PM para cada 600 habitantes, existe a previsão de aumento desse efetivo? Qual é o efetivo ideal para as cidades turísticas goianas durante a Copa? Esse efetivo está sendo formado?
18.  Em caso positivo da pergunta anterior e considerando que são necessários mais de 360 dias para a formação de um profissional para esta função, existe previsão de concurso público para a PMGO específico para essa região e cidades turísticas?
19.  Em caso positivo da pergunta anterior e considerando que a capacidade máxima de formação na Academia da PMGO é de 500 profissionais, onde estes novos policiais serão formados?
20.  Verificando a total ausência de planejamento e controle do trânsito nas cidades do Entorno e turísticas, existe previsão de verbas para a solução desses problemas?
21.  Estão sendo adquiridos equipamentos para verificação do teor alcoólico, buscas por armas, drogas, identificação civil, teste de DNA (mortos e desaparecidos), equipamentos de informática, helicópteros e outros para as cidades do Entorno e turísticas?
22.  Verificando que a população do Entorno será utilizada para os serviços básicos durante a copa no DF, existe previsão de assistência jurídica, trabalhista e econômica para esta população?
23.  Visando dar uma boa imagem aos turistas nas cidades do Entorno e turísticas, serão construídas redes de esgotos? As ruas das cidades serão asfaltadas? Existe verba para reformas das fachadas das casas e calçadas? Praças e parques públicos serão construídos? Hospitais? Bancos de Sangue e outros?
24.  Verificando que 500.000 mil pessoas deslocam todos os dias no sentido Entorno-DF no período da manhã e este mesmo montante no sentido DF-Entorno no período noturno, existe previsão do aumento do transporte público?
25.  Existem estudos sobre a implantação de câmeras nas cidades turísticas e do Entorno durante a copa?
26.  Verificando que serão construídas centrais de emergência e controle nas cidades sedes da Copa 2014, existe solicitação de uma dessas sedes para o Entorno do DF?
27.  Foi realizado estudo sobre o impacto da violência no Entorno sobre o policiamento ostensivo do DF durante a Copa 2014?
28.  Em caso positivo da pergunta anterior, existe previsão de redução das taxas de homicídios, estupros e roubos no Entorno?
29.  Em caso positivo da pergunta anterior, quais são os planos do DF sobre este tópico?
30.  Finalizando, quais serão os impactos sobre o turismo do Brasil, do DF e, principalmente, do Estado de Goiás caso ocorram sequestros, estupros e homicídios no Entorno durante a Copa 2014?



Giovanni Valente Bonfim Jr – Tenente Coronel PM

sábado, 28 de janeiro de 2012

O Nó Górdio da Segurança Pública

Artigo publicado em 2009, por ocasião da Conferencia Nacional sobre Segurança Pública.



Conta uma antiga lenda grega que o rei da Frígia, de nome Górdio, ofereceu sua carroça a Zeus em agradecimento ao trono que recebera. A oferta ao deus, lembrança de sua pobreza, ficou guardada na fortaleza da cidade, amarrada por uma corda com um nó tão complicado que ninguém podia desfazê-lo. Um império foi prometido a quem conseguisse desatá-lo. Mesmo assim, o nó permaneceu invicto por cerca de 500 anos até que Alexandre, o jovem filho de Felipe da Macedônia, chegou à Frígia. Apresentado o desafio do nó górdio, o jovem conquistador desembainhou sua espada e o cortou com um único golpe.

À semelhança da citada lenda grega, existe um nó górdio em nosso sistema de segurança, representado pela dicotomia (divisão de um gênero em duas espécies) instituída para a atividade policial dos Estados da Federação Brasileira. A função de polícia (gênero), que perfaz um todo (ciclo completo), é dividida entre duas organizações policiais (espécies ou ramos), autônomas, mas interdependentes, que realizam cada qual o ciclo incompleto de polícia.

A atividade policial engloba etapas que, considerado o evento crime como referência, conjuga ações que devem acontecer antes, durante e após sua ocorrência. A grande maioria dos países possui polícias de ciclo completo (em muitos casos mais de uma polícia), ou seja, que realizam plenamente o “antes”, o “durante” e o “depois”.

Coexistindo mais de uma polícia, modelo adotado por diversos paises, estas são instituídas sem interdependência, com competências sobre determinados territórios ou tipos penais específicos, mas sempre realizando o ciclo completo de polícia.

Como exceção a este modelo, o Brasil desenvolveu um sistema policial dicotômico: duas polícias de ciclo incompleto. Dividiu as etapas da atividade policial em dois ramos, estabelecendo duas (meio) polícias da seguinte forma: a Polícia Militar (polícia ostensiva) ficou responsável pelo “antes” e pelo “durante” (ações preventivas e repressivas imediatas) e à Polícia Civil (polícia judiciária) coube competência sobre o “depois” (ações investigativas e repressivas mediatas).

O sistema deveria funcionar como uma “corrida de bastão”, com cada instituição realizando sua parcela de responsabilidade e todas trabalhando pelo resultado final: a Polícia Militar realizando a polícia ostensiva e encaminhando as ocorrências para que a Polícia Civil prosseguisse a polícia judiciária (investigação) por meio do inquérito policial.

Infelizmente isso tem provocado um vácuo operacional entre as duas instituições com graves prejuízos para a sociedade. As duas polícias – de ciclos incompletos e interdependentes – não constituem um conjunto de elementos interconectados e organizados. Ao contrário, perfazem um todo desorganizado, anti-sistêmico, negativo, anti-orgânico, concorrente, egoístico, caótico e fadado à ineficácia.

Os antagonismos entre as duas polícias são históricos e universais, ou seja, sempre ocorreram, e não apenas nesta ou naquela unidade da federação, mas em todas, sem exceção. O ambiente anti-sistêmico estabeleceu uma concorrência altamente nociva entre as instituições, capaz de transformar bons amigos em adversários pelo simples fato de pertencerem a instituições diferentes.

A questão é estrutural e, por isso, reproduz sempre o mesmo modelo de desacerto e desarmonia, levando as organizações policiais a se perderem em seus próprios fins, permitindo que os interesses das categorias se sobreponham aos interesses da sociedade brasileira. Eis a origem das intermináveis demandas e disputas (silenciosas ou retumbantes), sustentadas por detalhes técnicos ou legais, que não são mais do que formas disfarçadas de garantir evidência midiática e reserva de poder.

Em meio a esse distúrbio organizacional, observa-se o recrudescimento dos índices de violência e de criminalidade e constata-se que, em virtude das disputas e das querelas legais, grande parte dos pequenos e médios delitos acabam não sendo tratados por nenhuma das duas organizações, fazendo crescer as subnotificações (omissão de registro) de ocorrências policiais pelo descrédito da sociedade na eficácia policial.

Como desatar o nó górdio da segurança pública? Já foi tentado quase tudo e, quando muito, se consegue estabelecer uma integração de fachada – “por decreto” – representando cinzas sobre brasas. Não há como integrar duas organizações que são antagônicas por imposição do sistema.

Nesse sentido, preleciona de forma inovadora e coerente o Dr. Ricardo Balestreri – Secretário Nacional de Segurança Pública – que a pacificação e otimização do sistema de segurança passa, necessariamente, pelo “divórcio das duas polícias estaduais”.

Isso se dará por meio da reengenharia organizacional do sistema, com a implantação do ciclo completo de polícia, ou seja, cada polícia atuando plenamente em uma dimensão de competências específicas por tipos penais, por divisão territorial ou por outra forma de atribuição, eliminando-se a perniciosa interdependência entre as organizações.

É preciso reconhecer que a complexidade e extensão das demandas da segurança pública exigem uma redistribuição mais técnica e coerente desse “trabalho” entre os órgãos policiais já existentes, incluindo-se nessa reavaliação o importante papel que as guardas municipais e penitenciárias poderão realizar.

Vencidas as indisposições naturais e optando-se, por exemplo, pelo ciclo completo de polícia baseado na divisão dos tipos penais, poderemos ter:

Uma polícia civil com competência sobre os delitos mais graves e complexos, o que seguramente redundará em níveis de esclarecimentos de crimes bem maiores que os atuais. Tem tudo para ser a polícia especializada do Estado.

Uma polícia militar com competência sobre os pequenos e médios delitos. Demanda esta que hoje se encontra reprimida (delitos contra o patrimônio) por falta de atendimento policial. Com essa pequena reformulação do sistema, teremos implementada a “teoria da janela quebrada” por meio de uma revolução no atendimento aos delitos de menor potencial ofensivo.

Uma guarda municipal encarregada das missões de proteção dos bens, serviços e instalações municipais, cabendo-lhe, ainda, ações complementares de vigilância ostensiva, principalmente em relação às contravenções penais.

Uma guarda penitenciária, encarregada da segurança das unidades penais e serviços vinculados (escoltas, revistas, vigilância, dentre outros), com papel fundamental para a segurança: primeiro, por atuar de forma especializada em serviço tão importante e; segundo, por evitar desvios de policiais de suas atividades fins.

A sociedade brasileira, ao longo das últimas décadas após a promulgação da Constituição Cidadã, já perdeu muito tempo em reflexões e atuações reativas que se mostraram inúteis na busca do funcionamento eficaz de seus órgãos de segurança pública. Todos os contextos e diagnósticos, até então elaborados, apontam para o esgotamento do atual sistema e recomendam reformulações urgentes.

Acreditamos que a 1 Conferência Nacional de Segurança Pública seja o gatilho psicológico a fomentar as mudanças tão necessárias para nosso sistema de segurança.


Robson Niedson de Medeiros Martins
Soldado da Polícia Militar, Gestor em Segurança Pública e Acadêmico de Direito

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

E quando os viciados em crack são os policiais

Agente da Polícia Civil é morto por traficante



O agente da Polícia Civil de segunda classe Renato Rodrigues Cardoso, de 39 anos, foi assassinado com uma facada no peito, às 16 horas de quarta-feira, quando voltou na boca-de-fumo em frente ao Parque de Exposições Agropecuárias de Goiânia, na Nova Vila, para comprar fiado mais pedras de crack.

Pela manhã, o policial civil esteve no local e comprou 80 reais em pedras. Ficou de pagar depois. Poucas horas mais tarde, sem o dinheiro, ele procurou novamente o traficante. Os dois discutiram. Renato queria mais pedra e o traficante, o dinheiro.

Ferido no peito, Renato ainda foi socorrido por uma equipe do Corpo de Bombeiros até o Cais da Vila Nova, mas não resistiu e morreu. No local, mais de vinte usuários de drogas estavam sob o efeito do crack quando a polícia começou as investigações.

Elias Pereira de Souza, de 26, suspeito de tráfico de drogas e apontado como autor do assassinato foi preso em flagrante pelo homicídio. “O Elias não sabia que o Renato era policial”, contou a delegada Adriana Ribeiro, que conhecia a história do agente, que era lotado no 4º Distrito Policial.


Fonte: Jornal O Popular (Goiânia-GO)


Comentários do BLOG:

A história desse agente não é um caso a parte, esta virando rotina nos quartéis e delegacias Brasil afora. Fechar os olhos para o problema, como tem sido o padrão até então adotado, não irá solucionar o problema. Policial sempre disposto, que não tem sono, não tem fome, não tem medo, não tem hora para trabalhar, é o mais operacional entre os mais operacionais... pode estar sob efeito de crack ou outra droga qualquer. O risco é da população e, principalmente, dos seus colegas de profissão. Pense a respeito!

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

ANÁLISE - A GREVE NAS POLÍCIAS MILITARES - Evolução e Perspectivas

Paralisações, greves e outros movimentos reivindicatórios de corporações militares era algo considerado inconcebível. Mas no mês de junho de 1997, foi deflagrado o primeiro e maior movimento de paralisação da história do país.

Greve da PM de Minas Gerais em 1997.

As paralisações de  1997

Paralisações, greves e outros movimentos reivindicatórios de corporações militares era  algo considerado inconcebível. Mas no mês de junho de 1997, foi deflagrado o primeiro e maior movimento de paralisação da história do país protagonizado por efetivos das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares que reivindicavam  melhorias salariais e condições de trabalho. A crise teve início na Polícia Militar de Minas Gerais, uma das mais conceituadas do país, pela insatisfação em seus quadros (sargentos, cabos e soldados) com o aumento diferenciado oferecido pelo então Governador Eduardo Azeredo (PSDB) aos Oficiais daquela corporação.  Com a  morte  de um Cabo da PMMG, que integrava a paralisação, atingido por disparo de arma de fogo em confronto  com colegas de farda, o movimento recrudesceu causando um  efeito dominó  que  atingiu 19 estados (AC, AM, BA, CE, GO, MG, MS, MT, PA, PE, PB, PI, RJ, RN, RS, RO, SP, SC, e SE).

As ações se caracterizaram por paralisações,  passeatas e atos de vandalismo contra viaturas e equipamentos. O Exército passou  a patrulhar as ruas no intuito de garantir a lei e a ordem em um quadro que apresentava insegurança crescente e beirava o caos social.  Com mortos, feridos e o índice de violência avançando consideravelmente, as paralisações começaram a desencadear  efeitos  negativos  na opinião pública  que apoiando o movimento aguardavam que as autoridades governamentais solicionasem a crise atendendo o pleito ou resolvendo a situação de outra forma.  As vésperas das eleições federais e estaduais (1998), e pressionados pelos efeitos políticos negativos da greve nas campanhas eleitorais, a maioria dos governadores iniciaram uma série de negociações com os comandos  de greve que eram apoiados pela Central Única dos Trabalhadores – CUT a qual aventava a possibilidade da sindicalização das PMs.

Acordos foram firmados com as Associações no sentido da não responsabilização penal e disciplinar dos grevistas e concedidos abonos e índices de aumento salarial aquém das expectativas, levando-se em consideração a insuficiente dotação orçamentária dos estados.  A maioria   dos envolvidos retornaram a seus ritmos normais de trabalho e algumas das PMs  (AC, BA, MS, PB, PE, RN, RS, e SP) ainda permaneceram mobilizadas aguardando o oferecimento de vantagens financeiras maiores do  que as prometidas, situação que nunca ocorreu.

A crise acabou revelando ao país de maneira mais ampla as dificuldades socioeconômicas enfrentadas pelos profissionais deste segmento da segurança pública ao mesmo tempo em que compeliu autoridades governamentais a iniciativas destinadas a agilizar a tramitação e a conseqüente aprovação de  medidas de  reestruturação  e de modernização r as políticas para o setor.

As conseqüências  

Ao analisarmos todo o contexto que envolveu o movimento grevista de 1997 pode-se afirmar que as reivindicações da categoria pouco ou nada avançaram além de ganhos pontuais. As Corporações encontram-se, na atualidade, no mesmo status de antes das paralisações de 1997. Algumas das promessas evoluíram como a  elaboração da PEC 300 (que trata de uma matriz salarial única para as PM com base nos vencimentos e salários da PM do Distrito Federal) mas acredito que mesmo aprovada, não deverá ser cumprida pelos Estados pela mesma razão já alegada.

Os episódios serviram principalmente como  bandeira de campanha a partidos políticos e principalmente para na eleição de policiais militares que comandaram os movimentos, à cargos parlamentares. Muitos, a exemplo do Cabo Júlio César Santos, bombeiro militar de Minas Gerais foi eleito deputado federal em 1998, reeleito em 2002 e dede 2009 é vereador em Belo Horizonte com expressiva votação. Considerando  o fato de que em alguns estados a categoria representa de 37% a 42% do eleitorado e, em todo o Brasil, soma um efetivo variável entre de 350 a 400 mil homens e mulheres.

Além das  poucas conquistas coletivas, o movimento deixou marcas profundas nas Instituições policiais militares resultado da quebra de princípios essenciais da disciplina e da hierarquia, criando e fortalecendo ressentimentos classistas que perduram até hoje.


Os movimentos de 2010 e 2011/12

Treze anos após a maior paralisação, em junho de 2010, aproximadamente 400  bombeiros militares do Estado do Rio de Janeiro se amotinaram invadindo o Quartel do Comando Central da Corporação, danificando veículos, equipamentos, instalações e impedindo o atendimento à população num movimento que reivindicava  novamente melhorias salariais e  condições de trabalho.  O  episódio se espalhou rapidamente pelas redes sociais e ganhou apoio de Corporações congêneres em outros  estados, de parlamentares e da população em geral.  Os grevistas foram presos por determinação da Justiça Militar pela prática dos crimes de motim e dano ao patrimônio público. Por meio de intensas negociações receberam “Habeas Corpus”  impetrado por um grupo de deputados federais e posteriormente a anistia administrativa de parte da Assembléia Legislativa daquele estado.  Ainda em 2010, o Senado Federal aprovou a Lei nº 10.191, que concedia anistia geral aos bombeiros grevistas do Rio, extensiva a oito estados (RN, BA, RR, TO, PE, MT, CE e SC) cujos efetivos haviam participado da paralisação de 1997 e  prestado apoio na greve de 2010.

Em 29 de dezembro de 2011, a greve ocorre na Polícia Militar e bombeiros militares do Ceará. O efetivo, reivindicando aumento salarial e condições de trabalho,  negou-se a realizar o patrulhamento ostensivo e impediu que viaturas deixassem os quartéis sendo necessário o emprego do Exército com apoio da Força Aérea e da Força Nacional de Segurança Pública. Parte do comércio  e  das escolas fecharam suas portas por medo da violência e a capital cearense ficou deserta em determinados horários. A greve durou cinco dias e o governo do estado cedeu as exigências concedendo o aumento pretendido com a promessa de anistia aos grevistas, que retomaram a suas atividades em 04 de janeiro de 2012.

Perspectivas

Movimentos desta natureza no âmbito das Polícias Militares já se tornaram rotina e ocorrem com desrespeito as normas constitucionais, a legislação vigente e uma afronta  aos princípios da disciplina e da hierarquia. O atendimento parcial  das  reivindicações de parte dos governos somados a anistia concedida aos comandos de greve contribui para  reforçar a importância destes movimentos e serve de exemplo para que outras instituições procedam da mesma forma.  Não há dúvidas  de que as reivindicações são por demais justas uma vez que as  PM  estão dentre as poucas instituições do estado nas 24 horas do dia junto a população e em  locais em que o poder público nunca esteve presente.
       
Mas não  é concebível que uma Instituição de natureza militar, que se destina a cumprir e fazer cumprir as leis, possa desrespeitá-las mesmo sob os mais nobres pretextos, igualando-se  aqueles  a quem  combate diuturnamente, como também não é que os vencimentos de seus profissionais se igualem aqueles.

Neste contexto, a maior  parcela de responsabilidade é  dos governos que não tratam a questão com a devida importância fomentando, mesmo que de forma indireta, a proliferação de movimentos desta natureza. Os problemas salariais e estruturais destas instituições permanecem inalterados e a tendência é que as paralisações se repitam em  determinados intervalos de tempo, quando a situação ficar insustentável  novamente.


André Luís Woloszyn, Analista de Assuntos Estratégicos, Pós–graduado em Ciências Penais e Criminologia, especialista em terrorismo (EUA), diplomado pela Escola Superior  de Guerra


Fonte: DefesaNet

domingo, 22 de janeiro de 2012

Nova York também teve sua cracolândia. E conseguiu acabar com ela

O Bryant Park, no coração de Manhattan, entre as ruas 40 e 42, virou um mercado de drogas a céu aberto cercado por traficantes, viciados e mendigos nos anos 80. Hoje, a região está plenamente recuperada




Prédios abandonados na região Alphabet City, na região de Lower East Side, em Nova York em 1986
Prédios abandonados na região Alphabet City, na região de Lower East Side, em Nova York em 1986 (Frances M. Roberts/Latinstock)

Há 25 anos, andar pelas ruas de Nova York não era tão seguro quanto é hoje. Os índices de criminalidade atingiam recordes históricos, muitas vezes motivados pelo tráfico de drogas. A epidemia do crack, que assolou a cidade na metade da década de 80, criou regiões em que o medo fazia parte da vida dos moradores locais — uma realidade parecida com a que os paulistanos enfrentam atualmente na Cracolândia, localizada na região central de São Paulo.

A cracolândia novaiorquina localizava-se no Bryant Park, coração de Manhattan, entre as ruas 40 e 42, a uma quadra da Grand Central, maior estação de trens do mundo e um dos cartões postais da cidade. Costumava ser um mercado de drogas a céu aberto cercado por traficantes, viciados e mendigos. Outro bairro, conhecido como Alphabet City, também em Manhattan, no Lower East Side, ficou por muito tempo sendo ocupado por traficantes, fato que destruiu a vida da comunidade local. "A cidade de Nova York foi a primeira experiência que tivemos com o crack nesse formato de pedra para ser fumada, sendo vendido nas ruas”, afirmou ao site de VEJA Robert Stutman, ex-chefe do escritório de Nova York do DEA (Drug Enforcement Administration), um órgão da polícia federal dos Estados Unidos responsável pela repressão e controle das drogas.

Um estudo realizado pelo Bureau of Justice Statistics mostrou que o uso de crack estava relacionado a 32% de todos os 1.672 homicídios registrados em 1987, e a 60% dos homicídios ligados às drogas. “O crack se espalhou rapidamente por Nova York. Isso aconteceu por uma combinação de baixo preço e do prazer proporcionado pela droga”, disse Stutman.

Spencer Platt/Getty Images
Bryant Park, em Nova York
Bryant Park, em Nova York, nos dias atuais

Pressão — Para vender o crack, os traficantes se estabeleciam em edifícios abandonados e assumidos pelo governo de Nova York por conta de impostos atrasados. Esses locais, predominantes em Alphabet City, ficaram conhecidos como crack houses. Além disso, os usuários também costumavam dirigir dos subúrbios até a área central de Manhattan para comprar a droga. O que facilitava a abordagem policial, segundo Stutman. “Eles nunca saiam do carro para comprar a droga, apenas se dirigiam ao local e recebiam a droga. E, nos Estados Unidos, há uma lei que se drogas forem encontradas em um carro, podemos apreender as drogas e os carros. Nessa fase, prendíamos centenas de carros”, afirmou.

A abordagem policial na época consistia em aumentar os reforços policias nessa região, em uma estratégia de dispersar os usuários. Na ocasião, havia um policial posicionado a cada esquina, quase que 24 horas por dia. O objetivo era prender os traficantes que ficavam perambulando pelas ruas. A estratégia, porém, fortaleceu ainda mais as crack houses, já que o consumo não chegava a ser controlado.

A operação, chamada Pressure Point, passou a focar nas organizações criminosas espalhadas pelos bairros. Para combater o tráfico, policiais à paisana eram orientados a comprar drogas com o objetivo de aprender mais sobre o tráfico; oficiais foram colocados no topo de prédios para observar a ação dos criminosos; e o número do efetivo também aumentou. Entre 1991 e 2001, a força policial de Nova York cresceu 45% — três vezes mais do que a média nacional.

Leis severas e tolerância zero — Outra medida que colaborou com o fim da epidemia de crack foi a aplicação de leis severas, já existentes. A lei Rockefeller, apesar de ter sido criada antes da epidemia, em 1973, foi responsável pela explosão no número de condenações por posse de drogas, passando de 2.554 em 1980 para 26.712 em 1993. A lei estabelecia sentenças mínimas obrigatórias de 15 anos até a prisão perpétua por posse de cerca de 110 gramas de qualquer tipo de droga. Entre os jovens levados à prisão, 70% usavam crack em 1988, contra 22% em 1996.

No início da década de 1990, o então prefeito de Nova York, Rudolph W. Giuliani, instaurou a política de tolerância zero, que impunha punições automáticas para qualquer tipo de infração, como a pichação, por exemplo. O objetivo é eliminar por completo a conduta criminosa e as contravenções. Durante sua administração, Giuliani reduziu pela metade as taxas de criminalidade de Nova York. Uma das armas foi a adoção do Compsat, um sistema utilizado pela polícia para detectar os principais pontos onde ocorrem os atos criminosos e levar a uma ação rápida de combate ao crime.

A legislação mais dura, combinada à ação policial respaldada pela política de tolerância zero, o crescimento econômico e mudanças demográficas, como o envelhecimento da população, são apontados como os principais fatores responsáveis pela redução de cerca de 80% nas taxas de crimes em geral em um período de 20 anos. Em 2010, a cidade registrou 536 homicídios. Alguns especialistas também argumentam que os efeitos destrutivos do crack tornaram-se aparentes, fazendo com que os novos usuários, com medo do poder maléfico da droga, ficassem longe dele.

Spencer Platt/Getty Images
Pedestres andam no bairro "Lower East Side", em Nova York 
Pedestres andam no bairro Alphabet City, localizado no Lower East Side, em Nova York

Justiça terapêutica — Uma alternativa surgiu para os usuários de crack no fim da década de 80. Em 1989, a Flórida criou as drugs courts, que eram tribunais especializados em atender usuários de drogas, formados por uma equipe com advogados de defesa, promotores, especialistas em saúde mental e em serviço social. Aqueles que eram pegos com uma pequena quantidade de drogas (até 28 gramas) podiam ter a sentença reduzida ou até a ficha criminal cancelada se não tivessem cometido delitos graves, como homicídios. A contrapartida era frequentar um programa de internação voluntária, com regras e condições previamente estabelecidas entre o réu, advogado de defesa, a acusação e o tribunal.

O estado de Nova York liderou a expansão e a institucionalização das drug courts nos Estados Unidos. Atualmente, são cerca de 180 tribunais de drogas em operação no estado. Até setembro de 2010, 60.588 pessoas participaram dos programas de tratamento oferecidos pelos tribunais de Nova York e 24.423 finalizaram o programa.

O que pode ser feito no Brasil — Segundo especialistas consultados pelo site de VEJA, o combate ao crack é um problema de saúde pública e de segurança pública e deve ser combatido nas duas frentes. "O tratamento é uma forma de reduzir o uso de drogas, os níveis criminais e também diminui a contribuição com os mercados ilegais de drogas. Mas a maioria dos usuários não aceita tratamento ou não permanece nele", diz Mark Kleiman, professor de políticas públicas da Universidade da Califórnia, em Los Angeles. "A oferta do tratamento não constitui uma solução total do problema, nem mesmo a prisão por si só", afirma Kleiman, que é autor dos livros Against Excess: Drug Policy for Results (Contra o Excesso: Política de Drogas para Resultados) e When Brute Force Fails (Quando a Força Bruta Falha).

Kleiman cita um programa chamado HOPE (Hawaii’s Opportunity Probation with Enforcement), criado em 2004, que consiste em reduzir as violações de liberdade condicional por infratores da legislação antidrogas. No projeto, os réus são submetidos a exames periódicos, feitos de surpresa, para confirmar se eles realmente abandonaram as drogas. Se o resultado der positivo ou se descumprirem qualquer termo da condicional, eles são presos imediatamente.

"Esse projeto tem tido um sucesso espetacular, alcançado 80% de abstinência na população alvo, após um ano de programa. Além disso, reduziu pela metade o número de novos encarceramentos", diz Kleiman. Atualmente, o programa está sendo replicado em alguns locais do país e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos está avaliando o modelo para possível financiamento federal.

Para Russel Falk, diretor associado do Centro de Intervenção, Tratamento e Pesquisa em Dependência da Wright State University, em Ohio, a aplicação da lei tem um papel muito importante para ajudar a reduzir os problemas que provêm do crack. "Não há dúvida de atividades policiais são necessárias para ajudar a reduzir o fornecimento de drogas que estão disponíveis, mas a redução da oferta deve ser acompanhada de programas de para a redução da procura, basicamente de prevenção e tratamento", diz Falck.

Nos EUA, foi feita uma abordagem combinando a aplicação da lei com a prevenção e tratamento. Apesar disso, Falck lembra que os investimentos não foram proporcionais em cada área. Cerca de dois terços dos fundos voltados para o abuso de drogas era para segurança pública, e o restante para o tratamento, pesquisa e prevenção. Segundo ele, uma distribuição diferente pode levar a melhores resultados.

Embora os dados epidemiológicos sugiram que o uso de crack nos EUA têm diminuído nos últimos 15 anos, os dados também mostram claramente que essa droga continua a ser um problema. "Uma pesquisa revela que pouco mais de 80.000 pessoas usaram crack pela primeira vez em 2010. E mais de nove milhões têm pelo menos alguma experiência com ele", diz Falck. "Você não pode colocar nove milhões de pessoas na cadeia. Então, programas eficazes de prevenção, intervenção e tratamento têm que fazer parte da solução. Apesar de termos feito alguns progressos nestas áreas, ainda temos um longo caminho a percorrer", afirma Falck.

Natalia Cuminale

Fonte: Revista Veja

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Experiência dos EUA pode ser exemplo para combate ao crack no Brasil

EUA conseguiram reduzir violência relacionada à droga, mas número de usuários ainda é alto

WASHINGTON - Em janeiro de 1990, uma operação conduzida pela polícia de Washington e pelo FBI (a polícia federal dos Estados Unidos) resultou na prisão do então prefeito da capital americana, Marion Barry, por consumo e porte de crack. O escândalo, amplamente noticiado, mostrava que a chamada "epidemia de crack" que assolava o país não poupava nem mesmo as altas esferas do poder.

Hoje, 20 anos depois, os Estados Unidos conseguiram reverter os índices de criminalidade relacionada à droga, e sua experiência pode servir de exemplo para países que enfrentam o mesmo problema, como o Brasil.

"Até certo ponto, a abordagem policial usada em São Paulo é similar ao que foi feito nos Estados Unidos", disse à BBC Brasil o pesquisador Russel Falck, diretor associado do Centro de Intervenção, Tratamento e Pesquisa em Dependência da Wright State University, em Ohio.

Desde o início deste ano, foi lançada em São Paulo uma operação policial para dispersar os usuários e traficantes da chamada "cracolândia", no centro da cidade.

"Não há dúvida de que reduzir a oferta de crack nas ruas é uma parte importante da equação para solucionar o problema", afirma Falck.

No entanto, apesar do sucesso na queda dos índices de criminalidade, o pesquisador afirma que a epidemia americana não acabou, já que o consumo de crack permanece alto no país.

"Nós ainda temos um problema aqui. Acho que uma mensagem importante é que não é possível solucionar o problema só com prisões. Colocar pessoas na cadeia sai extremamente caro. As autoridades deveriam considerar redirecionar parte desse dinheiro para tratamento e prevenção", diz.

Medidas

O reforço do policiamento nas ruas, as prisões em massa e o endurecimento das leis contra o tráfico (com penas muito mais duras do que para outras drogas) são apenas algumas das medidas adotadas nos Estados Unidos para reverter a explosão de violência que marcou a epidemia de crack, período que vai de 1984 até o início da década de 90.

A taxa de homicídios no país, de quase 10% para cada 100 mil pessoas em 1990, foi reduzida pela metade. Em Washington, o número de assassinatos caiu de 482 há 20 anos para 131 em 2010. Em Nova York, a queda foi de 2.245 homicídios em 1990 para pouco mais de 500 em 2010.

No entanto, a queda nos índices não pode ser creditada apenas à ação policial e às leis mais rígidas, e diversas outras teorias tentam explicar como os Estados Unidos conseguiram combater o problema, que atormentava não apenas as principais grandes cidades do país, como Nova York, Los Angeles ou Miami, mas também pequenas comunidades rurais no interior.

"Minha pesquisa sugere que não foi necessariamente uma intervenção do governo que solucionou o problema, mas sim a evolução de forças sociais e de mercado", disse à BBC Brasil o economista Paul Heaton, analista da Rand Corporation e autor de estudos sobre o impacto da epidemia de crack nos Estados Unidos.

Segundo o economista, uma das explicações para a queda na violência é a acomodação natural do mercado do crack, passada a novidade dos anos iniciais.

"Uma das maneiras de pensar sobre o crack é como qualquer novo produto que chega ao mercado. Inicialmente, há várias companhias (ou, no caso, gangues rivais) competindo entre si. Mas com o tempo algumas poucas acabam ganhando o controle do mercado", afirma.

Há ainda outras teorias que relacionam a queda na violência ao envelhecimento da população, mudanças demográficas ou até mesmo à legalização do aborto.

Usuários

Mas apesar do sucesso na redução dos crimes relacionados ao crack e de o consumo ter caído em relação ao pico da epidemia, os Estados Unidos ainda têm mais de 9 milhões de usuários (segundo os dados mais recentes, de 2010), e o fracasso na erradicação do uso da droga também pode servir de exemplo ao Brasil, dizem os especialistas.

"Apenas tentar desarticular o mercado de drogas, sem implementar outros programas para ajudar as pessoas que querem tratamento, não tem tantas chances de funcionar quanto uma abordagem multifacetada que envolva não apenas ação policial, mas também o fornecimento de serviços (aos usuários)", diz Heaton.

Segundo Falck, falta nos Estados Unidos um esforço para prevenir o uso de crack, como houve em campanhas bem-sucedidas em relação ao fumo e ao álcool, ou mesmo a outras drogas ilícitas, como a maconha.

"Nunca houve nada parecido em relação ao crack. As campanhas educacionais com maior sucesso provavelmente ocorreram de forma espontânea nas comunidades em que as pessoas viram seus amigos e familiares serem devastados pela droga. Isso serviu como um exemplo e uma razão para não se envolverem com crack", diz o pesquisador da Wright State University.

Falck observa ainda que oferecer tratamento é uma questão "extremamente problemática", já que há apenas terapias sociais e psicológicas disponíveis e que estudos indicam que a maioria das pessoas que usaram crack "além do estágio experimental" continuam a usar a droga por longos períodos, mesmo se forem tratadas.

"Ação policial e tratamento fazem parte da equação, mas sozinhos não são a solução para o problema", diz Falck.
 
 
Fonte: BBC Brasil